A arte de andar de ônibus
Tenho acumulado uma série de episódios sobre ônibus. Alguns amigos me falam para escrevê-los. A minha mãe quase briga comigo porque faz tempo que não escrevo. Mas é que, por mais que às vezes eu já comece a rascunhar um texto na cabeça, falta tempo (leia-se: disposição) para abrir o editor de texto e começar a escrever. Mas enfim… hoje eu tô tão revoltada, mas tão revoltada, que vou escrever alguma coisa. E aí desse jeito, pelo menos, eu desabafo.
Cara… andar de ônibus é, realmente, uma novela! Depender de ônibus é ainda pior. Ok, a gente sabe que há ônibus e ônibus. Aqueles ônibus que a gente pega na Zona Sul, ou para cruzar a Ponte Rio-Niterói, são tranquilos, não contam. Eu tô falando de ônibus meeesmo. Sem banco acolchoado, sem ar-condicionado, sem nada. E pior: lotadão!
Bom… na verdade tudo começa muito antes. Você sai de casa para trabalhar, de banho tomado, cheirosa, arrumadinha, cabelo no lugar, roupa limpa e passadinha. Linda! E daí pega o primeiro ônibus para cruzar a Ponte. Até aí, tudo bem. O problema começa na hora de descer. Tem que atravessar a passarela. Sobe a escada, cheia de gente esbarrando em você; anda a passarela com um monte de gente tentando te ultrapassar ou um desocupado que resolve passear na porcaria da passarela e bem na sua frente, é claro, às 6h da manhã; desce da passarela (para descer, todo santo ajuda, tá bom). Aí tem que andar uma rua enoooorme de salto alto, passar por debaixo de um viaduto que vive alagado (e aí não é legal quando passa um ônibus lá em cima e você está exatamente debaixo do viaduto) e depois de atravessar uma rua bizarra, cheia de bifurcações bem na sua frente, ainda tem que andar um pedação de calçada de terra, cheia de poeira subindo pelas pernas.
E hoje foi “ótimo”. O ponto de ônibus era em um lugar. Aí, há umas duas semanas o ponto andou um pouquinho para frente. E hoje eu tava lá, lindona (mas cheia de poeira) esperando o ônibus que demora uma eternidade pra passar. Fiz o sinal quase na rua e o cara foi embora!! Embora!!! Nem olhou!!! E daí olhei para trás e vi que o ponto tinha andado mais um pocão e ninguém avisou! Pô! Será que é tão difícil pendurar uma porcaria de uma plaquinha na calçada dizendo “Ônibus”??? Gente! Fala sério!
Lá fui eu para o outro ponto. Esperei mais uma eternidade. Quando chega o ônibus, você fica igual a uma barata tonta tentando advinhar onde o ônibus vai parar. Fica igual a um siri bêbado cambaleando para frente e para trás até o ônibus parar com a brincadeira de freiar e fazer aquele barulho irritante (tsss tssss tsss) e resolver parar. Aí pára. A porta vira um formigueiro. Muita gente se estapeando para entrar na sua frente! Cavalheirismo? Se perdeu no século passado. É surreal! Porque eu falo e as pessoas acham que eu estou exagerando. Mas vai falar com gente que pega ônibus do centro para cá??? Todo mundo se identifica. As pessoas se estapeiam meeesmo. Dá vontade de gritar “Calma, gente! Hoje tem lugar pra todo mundo” (teve uma vez que eu gritei, mas fica para outro texto).
Enfim, cheguei ao trabalho, atrasada obviamente (porque quem anda de ônibus tem todo um cronograma a ser seguido e se você perde um ônibus, já era) e aí tem que fazer praticamente uma trilha porque plantaram um matagal nos canteiros aqui da rua. Sério… é um canteiro de rua! É pra colocar plantinha baixa com espaços para os transeuntes. Mas não… trabalho na Barra… E Barra por acaso é lá um bairro para pedestres? Daí depois de fazer a trilha nível 5 com matos altos e fechados, cheguei finalmente ao trabalho.
Nisso, fica todo mundo te olhando como se você tivesse saído diretamente de um disco voador para o trabalho. Como se eu fosse de outro mundo, sabe? Claro, com o cabelo em pé e duro por causa da poeira, com uma camada marrom sobre toda a minha roupa e com resquícios de mato no pé, qualquer um acha que você acabou de chegar de um rally. Mas não! Cheguei de casa.
E sabe o que é pior? O pior é que quando você finalmente chega no escritório, sempre tem um desocupado que te encontra justamente entre a porta de entrada e a porta do banheiro (ou seja, ainda não deu tempo de me recompor) pra te fazer uma pergunta idiota do tipo: “Uéééé, tá de mau-humor?”. É mole? Ainda por cima, ainda querem que você ache graça!